Por Felipe Camargo de Oliveira
Preciso confessar que está cada vez mais difícil atualizar meu Linkedin. Nem costumo acessar, na verdade. Não só porque eu detesto essa rede social (repleta de discursos motivacionais fajutos e storytelling de startupeiro que não perdem uma oportunidade de passar vergonha corporativa), mas porque… bem, é sobre isso que vou falar.
Pra quem não sabe, além de redator publicitário, eu sou oficineiro artístico e terapeuta na Casa do Todos, uma instituição de saúde mental que eu adoro, todas as segundas-feiras de manhã. E agora estou na minha segunda graduação, dessa vez em Psicologia.
Entre uma coisa e outra, já fiz pós em tecnologia e artes, fiz design gráfico, contei histórias em hospital e em uma tribo indígena na Argentina, dei palestra sobre arte e saúde mental, fiz curso de jardinagem, instalei pia em casa de padres aposentados (sabia que padre se aposenta?), estudei gestão e mobilização para terceiro setor, ajudei a instalar ar-condicionado, dei aula particular de redação pra vestibular, escrevi e ilustrei um livro infantil, revisei outros…
Você pode achar que meu percurso é esquisitíssimo. Tem razão. Vou falar o quê, se é verdade? Sem falar que é coisa que não cabe, nem faz muito sentido, em um currículo de redator. Mas que me constitui. Como pessoa e como profissional também.
E aí o que acontece? Vez ou outra eu abro meu perfil corporativo só para aplaudir e desejar sucesso para meus amigos, e me deparo com uma pequena crise de identidade profissional: eu sou redator & terapeuta? Como vão entender isso? Como que pode?
Isso impacta na rotina de trabalho. Até hoje só a Fome topou essa maluquice de me permitir não ir à agência às segundas de manhã. Aliás, galera, eu sou super grato por isso!
Sou grato não só por mim, mas pela reflexão que isso me permite fazer hoje, e que posso compartilhar com mais pessoas nesse tal de mercado.
Acontece que não sou só eu nessa situação. Nós, pessoas, seres humaninhos, não conseguimos nos reduzir mais a só um objetivo profissional. A vida não é assim, ou é? Ainda que nossas escolhas de trabalho sejam importantes para dar foco na carreira, o que nos constitui moral, eticamente, intelectualmente, emocionalmente… vai muito além disso. Vai muito além de uma só escolha na vida.
Um parêntesis: afinal, reduzir uma pessoa à sua identidade profissional, ao seu trabalho, perguntar “o que você faz” na balada para alguém que você acabou de conhecer, é de interesse de quem? Quem ganha com essa ideia fixa formada socialmente que somos o que fazemos, somos funcionários de algo ou alguém, somos o tempo que empregamos e que nos empregam? Você já se fez essas perguntas?
São muitos por aí que mudam de carreira aos pouquinhos, ou pelas contingências do mercado, ou pela imaturidade ao decidir a faculdade com 17 anos. Também são muitos aqueles que dão saltos horizontais nos cargos, ou que resolvem investir mais tempo em um hobby e se percebem profissionalmente mais felizes assim… e são alguns que, por vontade ou necessidade de dinheiro, somam cargos e profissões. Tenho o privilégio de estar no primeiro grupo, mas não é assim com todos nessa situação. Bem, isso é outro papo.
O que quero destacar agora é o seguinte: eu realmente não sei o que colocar no meu perfil porque eu – e você também, mesmo que não assuma – somos voláteis, mudamos, mexemos, subimos, descemos, brotamos, enchemos, vazamos e queremos estar em constante movimento. Assim como a água num rio.
*Se você leu e pensou em “I don’t know what to do with myself”, do White Stripes, toca aqui o/