Março se foi, mas a ressaca do Dia das Mulheres segue com a gente. Eu sei, parece clichê, mas é a realidade. Ser mulher é uma jornada diária, massante, complicada. Metade do elenco da FOME está aí para provar isso. Somos uma agência 50% feminina, com 60% de mulheres em cargos de liderança.
Todas gigantes, que fazem seus papéis com maestria e se destacam por serem elas mesmas. Pra gente, isso é sinônimo de excelência.
Mas após essa reflexão, uma pulguinha se juntou à minha orelha: tudo bem falarem do Dia das Mulheres, dos direitos conquistados e do que ainda precisamos conquistar, mas como foi essa trajetória até aqui? A realidade de hoje tá tranquila tá favorável para um “Dia das Mulheres” de verdade? E o mais importante — como está a situação pras mulheres no amplo mundo da publicidade?
Vamos desenrolar isso juntas? Para comemorar a nossa luta e conquistas todos os dias, independente da data que nos foi designada.
Vamos até o século XIX. Foi nessa época que a mulherada começou a dar as caras no mercado de trabalho e buscar oportunidades fora do lar. Junto com esse movimento, vieram também a discriminação de gênero, limitações de progressão na carreira e estereótipos femininos.
O cenário evoluiu para melhor, o século XX trouxe avanços — mas precisamos ser sinceras, ainda temos um longo caminho pela frente para atingir o mínimo ideal de equidade (perfeição é uma palavra ridiculamente distante deste contexto). E isso porque nem estamos falando do principal problema para o desenvolvimento de carreiras femininas: a carga invisível de trabalho, que era papel apenas das mulheres até antes dessa inclusão no mercado, e ainda continua assim até os dias atuais.
Após essa breve introdução histórica, vamos afunilar um pouco mais o tema. Afinal, estamos no Brasil, então vamos focar nisso. De acordo com o IBGE, temos muitas mulheres no mercado de trabalho (mais de 53%, pra ser mais exata). Mas mesmo com essa presença toda, ainda existe desigualdade salarial. Em média, a gente ganha 20% a menos que os homens, segundo o IBGE.
Apesar dos perrengues e dificuldades, temos acompanhado de perto pequenas evoluções. Algumas empresas estão apostando no potencial feminino e dando oportunidades pras minas brilharem em posições de destaque.
Resumindo: tivemos muitas mudanças na última década, mas pra chegar na igualdade de verdade, ainda tem muita água pra rolar. Globalmente, as mulheres ainda representam apenas 38% do capital humano versus 62% dos homens, de acordo com estudo “The cost of gender inequality” (O custo da desigualdade de gênero, em tradução livre), do Banco Mundial.
Agora, como será esse cenário para as mulheres no mercado publicitário?
O mundo da publicidade é moderninho, inovador, descolado e liberal, mas o real é que também tem seus desafios.
Avaliando de forma ampla, quantas representações femininas estereotipadas você vê em campanhas? E nos bastidores, será que estamos conseguindo subir na carreira? A verdade é que o mercado publicitário também contribui com sua parcela de culpa quando o assunto envolve mulheres e mercado criativo.
Continuando nessa linha de raciocínio linear ao tópico anterior, podemos reparar que em diversas agências os papéis ou posições de destaque ainda são ocupadas por homens. Pense com a gente: quantas campanhas de prestígio saíram de mãos femininas? E para reforçarmos essa afirmativa, apontamos uma pesquisa da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (ABAP), que destaca que apenas 44% dos cargos de liderança nas agências de publicidade são ocupados por mulheres.
Dentro das agências, apesar da aparente igualdade de gênero nos quadros funcionais, existe uma discrepância gigantesca quando analisamos as posições estratégicas e criativas. De acordo com o levantamento “Publicidade Inclusiva: Censo De Diversidade Das Agências Brasileiras ODP 2023”, realizado pelo Observatório da Diversidade na Propaganda (ODP), 85% dos cargos de CEO das agências de publicidade são ocupados por homens, enquanto as mulheres representam apenas 15%. Já segundo a pesquisa da More Grls, de 2020, elas ocupavam apenas 25% do total de profissionais da área de criação, enquanto os homens eram 75% dos líderes.
A falta de presença feminina na alta liderança, tanto das agências quanto da área criativa, reflete diretamente no resultado final das campanhas. E por ocuparmos essa pequena parcela, muitas vezes conferimos mídias que retratam o sexo feminino de maneira totalmente frágil, o que reforça ideias um tanto quanto antiquadas e prejudiciais sobre nosso papel no trabalho e na sociedade de forma geral.
O resultado disso? A gente continua pisando em velhos estereótipos, que limitam a possibilidade de perspectivas femininas na representatividade da publicidade, com a perpetuação eterna de normas de gênero prejudiciais à igualdade.
Mas é possível mudar isso? Óbvio que sim! Apesar desses desafios, as mulheres da criação estão conseguindo apresentar campanhas premiadas (vide Nivea Doll ou Inequality Balls) e redefinindo o ambiente publicitário com visões únicas.
Estes movimentos têm chamado empresas à ação, incentivando que elas estabeleçam uma meta de alcançar 50% de mulheres em cargos de liderança. O próprio Pacto Global da ONU promove o movimento “Elas Lideram”, que estabelece o compromisso de ter metade dos cargos de alta liderança preenchidos por mulheres até 2030. Inclusive, recentemente grandes empresas como Mondelēz, Unilever, AlmapBBDO e P&G apontaram as consequências de ter 50% de suas lideranças executivas e estratégicas nas mãos de mulheres: liderança mais abrangente e sólida, empresas mais plurais e focadas na diversidade, resiliência, inovação e engajamento, políticas atualizadas e benefícios significativos, criando um ambiente de trabalho que apoia o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, o que contribui para baixo turnover de equipes criativas, maior engajamento e maior rendimento e entregas de resultados crescentes em todas as áreas.
Recentemente, convidamos algumas de nossas lideranças pra contar qual o principal papel que elas ocupam dentro do mercado publicitário. Para Carol Brandão, nossa Líder de Atendimento, é “batalhar para que as próximas gerações não conheçam desigualdade de gênero e não sejam diminuídas pelo simples fato de serem mulheres. Ser mulher é provar diariamente pra si mesma que você é capaz e merecedora de ser valorizada.”
“Estamos constantemente sendo subjugadas ou tendo nossa autoridade questionada. Hoje quero abrir espaço para a atuação de outras mulheres, para que existam cada vez mais referências femininas em diversas profissões e cargos de autoridade.” complementa Maila Atan, nossa Gerente de Projetos.
E eu, Marcela Neilly, Líder Criativa da FOME, acredito que precisamos encontrar novos caminhos para exercer a criatividade dentro de um mercado ainda misógino e antiquado.
É importante que cada vez mais mulheres se sintam confiantes para estar à frente de cargos executivos e lutem pelo sucesso em suas carreiras. Por isso, quisemos jogar luz nesse tema, para contribuir com a ampliação dessa discussão que muitas vezes passa batida pelos grandes veículos de publicidade que conhecemos.
Seja lá qual for sua área de atuação, o mercado de trabalho está em constante evolução quando o assunto é a mulher. Ainda tem muita barreira pra quebrar, mas estamos caminhando em passos mais largos nos últimos anos.
Para a FOME, o apoio deve ser essencial para que todas as mulheres possam continuar avançando e quebrando barreiras dentro da publicidade. Quanto mais a gente se unir, mais rápido vamos conseguir mudar essa história tenebrosa.
Continuaremos lutando pelas questões de gênero e apoiando nossas colegas de trabalho. Levantem mulheres, abracem o trabalho de suas iguais. Só assim o futuro do mercado tem alguma chance de ser verdadeiramente inclusivo e equitativo para todas as pessoas.
Sim, existem empresas que estão realmente olhando para o futuro. E ele, além de feminino, é brilhante.